A desconhecida
Há uma luz que se define ambiguamente em teu olhar.
Em meu
voyeurismo exasperado, escondo-me atrás das colunas que sustentam minha
fortaleza e vejo-te passar nos arredores onde há um bosque virgem, de
beleza que não se espelha em minh’alma, e que é fonte das suas
descobertas pueris.
Às vezes, abandono a segurança dos meus altos
muros e vou ao bosque sozinho colher frutos, tocar as árvores, escalar
para ver os filhotes nos ninhos. Nada me comove tanto, nada faz brilhar
meus olhos como os seus, nas suas explorações.
Pensei se você não é
apenas um meu delírio esquizofrênico, alguém que só eu posso ver, parte
de mim que se desgarrou por falta de espaço para se desenvolver. Um
fantasma, uma fada, um anjo... quem é você?
Está sempre só, sempre
feliz, sempre exibindo um fulgor incondicional, quase lua, quase
primavera, quase flor e quase estrela... Como consegue?
Eu que sou
guerra, sou pedra, gelo e espada; que corro, olhar fixo nos objetivos,
desviado de qualquer coisa diversa; que amo sem amar, que vejo sem ver,
que toco sem sentir, vivo sem vida; sempre opaco, sempre ofuscado,
sempre atrás de minhas posses, das minhas colunas, das minhas armas e
armadilhas. Involuntária e irremediavelmente só, depois de ter minado as
estradas de acesso, as pontes, os portos, desviado as trilhas, duvidei
que houvesse alguém capaz de alcançar essa rocha alojada em meu peito,
onde já foi abrigado um coração.
Até aparecer você, que nem conheço,
que nem sei se existe, inesperada visita, para me acordar os sentidos, o
coração ausente e a alma inerte. Sinto pela primeira vez a
possibilidade de estar literalmente vivo, seja lá o que isso possa
significar.
Agora, aguardo ansiosamente uma nova visita e dessa vez
terei coragem para te dizer tudo o que provocas em mim, que nem sei se
saberei expressar. Mas quem compreende os ruídos da natureza, saberá ler
meus sinais, presumo. Estou aqui. Venha, minha doce desconhecida,
venha!
Venha trazer-me o sopro divino do amor.
(texto publicado originalmente no meu antigo blog em 2006)
(texto publicado originalmente no meu antigo blog em 2006)
Nossa, Carlitos, que texto lindo! De uma delicadeza... Gostei demais.
ResponderExcluir"Está sempre só, sempre feliz, sempre exibindo um fulgor incondicional, quase lua, quase primavera, quase flor e quase estrela... Como consegue?/"
Você escreve lindamente bem!
Ah, minha querida amiga, fico feliz que tenhas gostado! Eu mesmo gosto bastante desse, é um dos meus preferidos. Foi escrito em 2006, o melhor ano pra mim, o mais inspirado. E se eu te disser que ele veio de uma vez, que só precisei trocar uma ou outra palavra pra encaixar melhor? Eu me pergunto de onde vem essas coisas também rs
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